9 de março de 2013

Chavismo e a ilusão da luta anti-imperialista;

Após a morte de Chavez, fomos bombardeados com imagens e frases em apoio ao líder populista, que de acordo com grupos da esquerda, "realizou a proeza de fazer uma revolução democrática na Venezuela". Obviamente, que a direita condena. Mas não me interessa nesse momento debater com a direita, mas sobretudo, dialogar com grupos políticos de esquerda que defendem esse legado sob a perspectiva da "luta anti-imperialista".

latuff está certo. Agora se trata de pensar como Chavez entrará para a história.

Um dos maiores problemas que enfrentamos nos debates políticos dentro da própria esquerda é a falta de estudo e a miséria intelectual que faz com que a maior parte dos que assim se posicionam, defendam bandeiras das quais de forma profunda, desconhecem as origens e as implicações políticas, sociais e econômicas. Sendo a maior crítica da esquerda, a sociedade capitalista, na maior parte das vezes se ignora a força motriz dessa sociedade, ou seja, seu modo de produção. A dificuldade de entender que apesar da influência cultural e política que influi na manutenção desse sistema, o que de fato o sustenta é o seu modelo econômico sob uma sociedade dividida em classes. Essa clareza, que muitas vezes nos falta, é o que leva muitos a se perderem no pântano das lutas sociais democráticas e pequeno-burguesas. 

Transformar a sociedade capitalista está em primeira ordem para todo indivíduo que se considera revolucionário, mas como realizar essa transformação? Nesse momento se revelam os verdadeiros revolucionários, aqueles de de fato vão na raiz da questão, não de forma idealista, mas concreta, tomando como ponto de partida, os aspectos históricos, políticos, ideológicos e econômicos que são a base desse sistema. Ora, se o capitalismo se concentra, sobretudo, na detenção dos meios de produção por uma classe minoritária e a exploração do proletariado, como podemos pensar uma revolução que não seja a tomada de poder por essa classe que é a força propulsora de quase tudo que é produzido na economia capitalista?

Uma "revolução democrática" que através do sistema parlamentarista burguês elege um candidato do povo, não me parece, nem de longe, se configurar enquanto uma revolução. Mas essa aparência precisa ser superada por uma análise histórica mais rigorosa e isso me leva ao ponto crucial da minha crítica ao Chavismo, pois a  medida em que não houve a tomada dos meios de produção pela classe trabalhadora e não há um processo de modificação do modo de produção, o que de fato sobra para chamarmos de revolução? Seu espectro político?

Então é preciso ir mais a fundo e pensar as raízes do Chavismo e sobre qual pilar teórico ele se sustenta. Fundalmentamente, como o próprio Chavez sempre fez questão de defender com orgulho, Simon Bolívar e sua luta em prol da libertação da américa. Bolívar foi um indivíduo que se aproximou da política através do seu tio e foi levado a frança onde conheceu Bonaparte, por quem inicialmente, teve grande admiração. Se aproximou dos ideais iluministas que estavam em efervescência no pós-revolução francesa. Esse breve panorama geral da iniciação política de bolívar que desembocou no seu juramento pela libertação da America e posteriormente as lutas que ele liderou, nos diz o suficiente para pensar que esse ideal "revolucionário" se deu em um fortalecimento nacional e unificado frente a uma dominação colonial, sob princípios fundamentalmente liberais. 

Séculos depois, ainda é possível ver que esse pântano que cerca a questão revolucionária ainda é um obstáculo difícil de ser superado pela esquerda, a medida em que apesar da America não ser mais colonia da Europa, continua, desde antes de bolívar, totalmente dependente do capital e suas relações comercias. Não somente a America, mas todo o mundo. Portanto, tampouco bolívar defendia uma revolução, como jamais almejou uma transformação da sociedade, pelo contrário, sua luta tem um espectro nefasto da distorção das reais condições que mantinham (e mantém) a dominação de determinados países sob o mundo. 

O que implica Chavez e outros tantos grupos defenderem uma libertação da America latina frente a dominação imperialista? Apenas mais um engodo distópico que nos remete a uma situação de aparente luta, mas que por pano de fundo, mascara a real situação econômica (e suas transações comerciais), centralizando na figura de um líder de fala macia ao povo, o poder executivo, enfraquecendo o poder legislativo, mesmo ainda dentro dos limites burgueses. Um pouco de razão e memória nos levará ao próprio bonapartismo. 

"Mas ele estatizou e tomou ao povo o que antes estava na mão da iniciativa privada" 

Quantas vezes ouvi esse argumento? Que validade tem o ESTADO ao tomar os meios de produção para si, sendo que esse estado não é gerido pelo próprio povo, mas que se concentra na mão de um governo sustentado por um líder popular? Do ponto de vista autoritário tem uma grande validade. Ou vamos considerar Getúlio um grande revolucionário também? Afinal, ele não só fortaleceu a indústria nacional como estatizou quase que o país todo. Além de ter criado as tão "progressistas" leis trabalhistas. Ora, apesar de Getúlio não se apossar do discurso anti-imperialista, sua política não muito se diferenciou do Chavismo. 

E é ai que a ilusão da luta anti-imperialista cai por terra, porque mesmo com todos belos discursos, a Venezuela não deixou de negociar com países que tem relações comerciais diretas com os EUA, "o maior inimigo imperialista da america-latina". O próprio Brasil e até mesmo Cuba, que apesar de se dizer socialista e anti-imperialista, tem transações comerciais importantes com os EUA, como divulgou o wikileaks  recentemente. Tamanho paradoxo não é tão difícil de se explicar, a medida que mais uma vez, é preciso ir na raiz da força motriz do capitalismo, enquanto não se superar o seu modo de produção e travar-se uma luta INTERNACIONAL pelo tomada dos meios de produção pela classe trabalhadora, jamais veremos o capitalismo ser superado e tampouco o imperialismo, que se configura no seu estágio avançado.

Por tudo isso, não se trata de fazer uma "crítica a direita", mas uma crítica a própria esquerda, que ao deixar de visar a luta revolucionária, acaba se perdendo em discursos populistas que não nos levará a nenhum lugar além do que a própria social democracia já nos leva aqui no Brasil¹, e também não podemos nos esquecer que para muitos, até mesmo o Lula é socialista.

Afinal, não foi a Dilma que acabou de anunciar quem em sua gestão estamos a cada dia superando a miséria através de grandes conquistas sociais?

Conquistas sociais não nos tiram do estado de constante exploração, por isso eu reforço:


"proletários (explorados e iludidos) do mundo, uni-vos²"

Pela construção de uma revolução que nos leve a uma superação real da dominação capitalista.


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¹ com o agravamento de uma política nacionalista, que tende (ou leva) ao autoritarismo.
² citação de Engels e Marx, "manifesto do partido comunista", acrescida de uma parentese meu.