10 de fevereiro de 2013

Batman, a contra-revolução em forma de herói;

Quando eu deixo o conforto do meu lar e me direciono a um cinema tomada pela vontade de entender a aclamação crítica de um filme sobre super heróis, sei que o que está posto no horizonte é o cheiro das trevas. Se tratando de um filme sobre o Batman, herói que se quer me causa sentimentos, vejo uma urgência histórica. E isso me direcionou a entender o fenômeno do último filme "Batman e o cavaleiro das trevas ressurge".

Em um primeiro movimento, podemos identificar o herói Batman. Um personagem movido por suas paixões e magoas, cujas posses não possibilitam a redenção do passado. Pela amargura, constrói-se o mito, do homem que emprega sua riqueza e energia para combate do mal que paira sob Gotham, desde que nisso, seja preservada sua identidade. Como todo burguês de consciência social, ele vai ajudar crianças órfãs e dedicar parte de seus lucros a projetos de caridade, enquanto constrói uma bomba no seu quintal, obviamente, sem que ninguém saiba de sua identidade. Sempre retratado sob a ótica das intenções, de no fim do dia salvar mais uma vez o mundo, o Batman é sem dúvidas um dos heróis mais humanos e também mais representativos enquanto sujeito de uma sociedade de classes. Eu poderia até dizer, em uma análise mais direta, que não há herói que represente melhor o burguês contemporâneo do que o Batman. O burguês que não deixando de ser burguês, continua a querer salvar o mundo da sua própria desgraça. O burguês que ninguém sabe quem é, mas que existe e pode ser identificado pelos destroços de todas as bombas construídas

Em um segundo movimento, é necessário contextualizar a liga das sombras e todo sua analogia com movimentos revolucionários. Os oprimidos, originários nos esgotos de uma sociedade hipócrita, produto do sofrimento do abandono, que aparecem sob a bandeira da transgressão da ordem. Ordem essa que produz, o exército que está pronto para desestabiliza-la. A imagem do terror, que a ordem não consegue sobrepujar, todo o horror que a sociedade uma hora tem que encarar, o fim que todo mundo sabe, que cedo ou tarde chegará.

Não há estória mais contemporânea que a heróica do Batman. A luta de classes retratada, no seu apogeu histórico, ou como poderia dizer na melhor expressão do "vai ou racha". Assim, Nolan resgata, de forma oportuna, aquilo que desperta no seio da alienação os elementos mais viscerais da nossa apatia histórica. A necessidade de herói e do vilão, para um desfecho trágico de nossa ordem. É o espírito de nosso tempo, permeado de muitas caracterizações problemáticas e ao mesmo tempo necessárias. Por isso que Batman desperta a crítica e o furor de todas as partes, pois nem mesmo a burguesia, nem mesmo os revolucionários querem ser identificados da forma como o Nolan constrói tal problemática, porque ambos hesitam em se por no ângulo da imagem posta diante de seus olhos.

E nem deveriam. Porém o que se torna interessante nesse filme, e de certa forma, é posto sobre essa perspectiva, é a reflexão sobre o ponto no qual nos encontramos. Não é possível mais ignorar a desordem. Seja lá qual o lado que o espectador se coloca, os elementos reflexivos estão postos para questionar qualquer posição que já esteja tomada. Da mesma mão que vem a salvação heróica, procede também a origem de toda destruição. Tal como de toda ideia de equalização, há também os elementos de consolidação do terror que pode nos levar a nada. Revolução não seria a questão, nem mesmo o circo armado. A questão é sobre nós, e o outro. E sobre uma escolha que hora mais, hora menos não tardará em ser tomada.

Por isso, qualquer crítica ao filme precisaria passar por uma crítica a nossa sociedade. Não que Nolan seja um elemento neutro de análise. Mas é que mesmo sob sua ótica de classe, há um fragmento de brilhantismo que nos faz ter que ceder, mesmo que temporariamente, as suas analogias históricas.